Servidora municipal e mãe: avanços e desafios na Prefeitura de Belém

As mulheres correspondem a 67% de servidores ativos da Prefeitura de Belém, o que, numericamente, significa 14.162 trabalhadoras. Desse total, 55% estão na faixa etária de 25 a 49 anos de idade e 42%, na de 50 a 74 anos. O perfil demanda do poder público e da sociedade um olhar cuidadoso, especialmente considerando que a desigualdade de gênero e a sobrecarga de responsabilidades sobre as mulheres se impõem como um desafio em todo o território nacional, sobretudo para aquelas que são mães e mães-solo.

As servidoras Myriam da Silva, da Secretaria Municipal de Administração (Semad), e Ednilza Santos, da Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel), contam um pouco sobre como conciliam sua jornada na administração pública e o trabalho não-remunerado. E a iniciativa inovadora com o projeto Ver-o-Cuidado, realizado em parceria com a ONU Mulheres.

Myriam tem mais de vinte anos de carreira. Além de seus compromissos profissionais, ela se dedica a acompanhar sua filha Ludmylla até a escola todos os dias, um gesto que vai além de garantir a segurança da adolescente. “É um momento de qualidade na nossa relação. Tem sido importante, especialmente, durante esta fase da vida dela”, explica.

A servidora desempenha suas funções como chefe da Divisão de Recursos Humanos com entusiasmo e sempre busca encontrar um tempo para cuidar de sua saúde, praticando exercícios físicos na academia e se doando para sua grande paixão, a dança. Myriam faz parte do Batalhão da Estrela, na modalidade dança, do Arraial do Pavulagem, mantendo viva sua conexão com a cultura e a tradição da capital paraense.

A aprovação no curso de Administração, na Universidade Federal do Pará (UFPA), foi um dos momentos pessoais mais marcantes de que Myriam recorda. “Ampliou minhas oportunidades como profissional e me capacitou para desempenhar melhor minhas funções”, afirma. Agora, com formação no curso superior, ela espera ampliar suas perspectivas profissionais.Entre as servidoras públicas da Prefeitura de Belém, a maioria, 5.691, tem formação de nível superior e 1.130 são pós-graduadas. Outras 4.852 têm nível médio.

Ednilza Santos também vem dando passos importantes em sua carreira, conciliando com a maternidade e cuidados pessoais. Após nove anos de dedicação ao serviço público e aos 30 anos de idade, tornou-se mãe. Ela já desfrutava da independência financeira, proporcionada pelo emprego, quando encarou o desafio de ingressar no curso de Economia.

A jornada se tornou mais pesada. “Confesso que foi uma tarefa um tanto desafiadora, pois eu era servidora pública, universitária e mãe. Mas tudo fluiu no seu tempo e pude conduzir da melhor forma possível, conseguindo, além de trabalhar, me formar e criar minha filha”, explica a servidora que teve seu segundo filho nove anos após o nascimento da primeira.

Ver-o-Cuidado

Inédito no Brasil, o projeto-piloto de implementação do Sistema Municipal do Cuidado em Belém, intitulado “Ver-o-Cuidado”, teve início em maio de 2022 e já tem sido referência para iniciativas do Governo Federal.Fruto de parceria entre a Prefeitura de Belém e a ONU Mulheres, com financiamento da Open Society Foundations, o projeto é desenvolvido em duas frentes. A primeira tem como foco o apoio à gestão municipal e às instituições públicas na elaboração e implementação de um sistema de cuidado.

Paralelamente, as atividades também alcançarão as trabalhadoras do cuidado, remuneradas ou não, atuando no desenvolvimento de suas capacidades nos aspectos pessoais e profissionais, para que acessem trabalho decente e autonomia econômica.

A iniciativa, que já inspira o plano nacional de cuidados do Governo Federal, é conduzida por um comitê gestor do qual fazem parte tanto a ONU Mulheres quanto 11 órgãos da Prefeitura de Belém: Funpapa; secretarias municipais de Administração (Semad), de Educação (Semec) e de Saúde (Sesma); Banco do Povo; coordenadorias da Mulher (Combel), Antirracista (Coant) e da Diversidade Sexual (CDS); Coordenação das Políticas de Segurança Alimentar e Nutricional (Copsan); Comunicação Social (Comus); e Instituto de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos do Município de Belém (Iasb).

Avanços e modelo para o Brasil

“Quando se fala de direitos e quando nós falamos das políticas municipais algo que é muito significativo é a representação quantitativa das mulheres no serviço público. Quando olhamos para as estruturas de representação de funções de direção, as mulheres também têm grande peso. A começar pela própria decisão política do prefeito de compor seu secretariado com, no mínimo, 50% constituído por mulheres”, contextualiza a secretária municipal de Administração, Jurandir Novaes.

É notória ainda a sobrecarga sobre as servidoras inativas. “É muito alta a quantidade de vínculos a essas mulheres aposentadas comparativamente aos homens. Ao mesmo tempo, isso também reflete no afastamento para cuidar da saúde de outros. Não só pelo adoecimento próprio, das mulheres, mas, há um percentual que varia em torno de 10% de mulheres que se encontram em condição de afastamento para cuidar de outras pessoas”, agrega a secretária.

Jurandir Novaes destaca que “quando se fala de cuidado, com o projeto Ver-o-Cuidado, é uma política nova, mas, não tão nova do ponto de vista da sua prática. É a valorização e o reconhecimento dessas jornadas não-remuneradas. Não é só isso o projeto, mas, eu destacaria esse aspecto da jornada não-remunerada e o desafio que nos coloca dentro do serviço público, desafio da oferta de possibilidades em que essa mulher possa congregar os seus diferentes papeis no trabalho, no lazer, na formação, no seu exercício profissional dentro dos órgãos e a relação de outras mulheres que estão nesse âmbito familiar. Como gerar essa oferta de serviços e possibilidades que traga para as mulheres maior liberdade inclusive de cuidar de si”.

A iniciativa já começa a render frutos. “De forma inovadora, dentro dessa estratégia da construção da política municipal de cuidados em curso, temos uma linha muito particular de Belém: um dos nossos eixos de atuação é voltado para servidores municipais, mulheres, não exclusivamente, mas, muito voltado para mulher. Com base nisso, já houve atividade de formação para um grupo de mulheres servidoras, para compreender, conhecer, se aproximar das experiências e como essas políticas são construídas”, informa a secretária. Para ela, é tempo de reconhecer estas mulheres, não apenas de parabenizá-las.

*Colaborou nesta reportagem Débora Brelaz, estagiária de Jornalismo na Semad

Texto:

Erika Morhy

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